segunda-feira, 21 de março de 2011

Rasgo o céu no meu peito


Meu poema declamado pelo meu amigo José Silveira, um ser humano e poeta enorme...obrigada meu amigo


http://www.goear.com/listen/34f220c/r ... eito-declama-josesilveira


Termino-me na manhã que não chega,
nas ruas de terra batida,
onde os meus passos já não deixam marcas.

Rasgo o céu no meu peito
à procura dos gritos esfomeados,
dos melros que esvoaçam nos pinheirais da minha inocência.

As cartas eram escritas com letras acetinadas sem direção,
lavradas na terra em folhas de hortelã,
o tempo esgueirou-se do meu olhar adocicado,
roubou-me as papoulas,
onde eu repousava o cálice compassivo da vida.

Rasgo o céu no meu peito
aonde as esmolas são dadas sem caridade,
como quem apregoa hipérboles decadentes
nos murmúrios das fontes,
enfadadas pela alcoolemia das larvas dos meus braços,

à espera da metamorfose obsoleta
das palavras que estrugem na boca do inferno.

Termino-me na manhã que não chega,
e renasço na chegada onde me termino.

Conceição Bernardino



segunda-feira, 14 de março de 2011

Parabéns minha querida mãe…





Meu amor, se soubesses como procuro dentro do teu olhar o vazio que deixas repousar sobre os teus ombros encolhidos, quando o silêncio se pronuncia por ti nas palavras não ditas, sinto-me tão impotente nesse ensejo que daria os meus olhos para te encontrar.



Olho-te, arranco-te um sorriso feito de emoções embrulhadas nos nossos corpos, num papel de abraços cristalinos e a lágrima cai sobre um laço de amor que não se explica sente-se mutuamente em cada segundo que passa, por mais doloroso que seja, por mais feliz que te veja é assim que nos protegemos, ontem tu hoje eu.



Hoje jurei que não choraria: mas sabes às vezes sinto tantas saudades daqueles tempos em que me deitava no teu regaço com medo da vida e tu consolavas a minha dor a incompreensão que emergia de dentro de mim. Quando saímos juntas para comer um gelado nas noites quentes de Verão.



Ò meu amor, minha mãe como se explica este amor que sinto por ti, às vezes dói tanto que sangra…talvez seja as dores de um parto abençoado que carregamos juntas todos os dias.





Conceição Bernardino

sexta-feira, 11 de março de 2011

Não creias só nas lágrimas dos homens



Sublinho a negrito a dor


Dos rostos que se levantam das sombras


Onde os corpos se plantam pela raiz


Num mar de ondas sonantes


Feito de pautas metaliformes



Não creias só nas lágrimas dos homens


O céu também chora, amotina-se


Como uma criança que desconhece a maldade


Do seu semelhante, acabado de nascer



Agora,


Que os olhos se fecharam


Nascem heras nas paredes


Que ainda se mantêm de pé


Nos bolsos de um fato negro


Remendado por linhas descontínuas



Conceição Bernardino

sexta-feira, 4 de março de 2011

Deixa-me ler-te à luz da vela





No deserto do tempo impune


Arranquei labaredas dos teus olhos


Sem saber se as algas


Que me salgavam o rosto


Tinham o mesmo sabor frio


Das mazelas que pintei no teu corpo



Quem me dera poder apagá-las


Num simples traço a carvão


Sucumbindo em seguida


Sob os braços da Mendiga Romana



Talvez o lamaçal d’ escuridão


Que carrego nesta pena incondicional


Partisse com o clarão de luz


Que atravessa esta cela de barro



Deixa-me ler-te à luz da vela


Quando o dia se acabar





Conceição Bernardino